Os políticos estão a sair do armário
Por Margot Cardoso
Este psicólogo brasileiro acha que os políticos que se assumem como homossexuais ajudam a aumentar a tolerância da sociedade e combatem a discriminação. E considera que todos os homossexuais devem poder casar e adotar crianças.
Quando começou a atender homossexuais, João Batista Pedrosa procurou apoio de um especialista, mas não conseguiu. Tentou encontrar livros específicos e concluiu que pouco ou nada havia sobre o tema. Então resolveu desbravar este caminho. Hoje, diz que o principal objetivo dos homossexuais quando procuram ajuda é viver sem culpa nem vergonha de sua sexualidade. Mas não é fácil. Além da auto-aceitação, o princípio de tudo, ainda têm de combater os preconceitos da sociedade.
Ao fim de quatro anos de investigação e 52 atendimentos a homossexuais, decidiu juntar os seus conhecimentos em livro - Segundo Desejo, lançado recentemente no Brasil. A obra, recomendada a pais, educadores e profissionais da saúde, pretende sobretudo combater uma das principais causas do preconceito contra o homossexual: a falta de conhecimento.
Quem são os seus clientes e que tipo de ajuda eles procuram?
São os que sofrem por não aceitarem a sua própria homossexualidade. O meu trabalho é fazer com que deixem de ter problemas com sua orientação sexual, para que sejam felizes, vivendo sem culpa ou vergonha.
Como é que o gay lida com a descoberta da sua homossexualidade?
A primeira etapa é a total negação da homossexualidade, o receio da descoberta faz com que muitos se envolvam em relacionamentos heterossexuais. A segunda fase é a dissimulação tendo um relacionamento homossexual clandestino, uma "vida dupla" e muito medo da descoberta e da punição. A seguir vem a resignação, em que o indivíduo fica na semiclandestinidade, estabelece uma ligação estável com um parceiro que apresenta a um grupo restrito de amigos. A homossexualidade é reforçada positivamente, mas a sua grande preocupação é não ser descoberto por amigos, familiares e colegas. Evita falar da sua homossexualidade, não nega nem assume publicamente e frequenta lugares públicos típicos da comunidade homossexual. Por último é a aceitação, revelando publicamente a sua orientação, tendo orgulho de ser homossexual.
Muitas vezes os problemas começam logo com a família. Como é que os pais podem aceitar a homossexualidade dos filhos?
O ponto de partida é a sensibilização. Os pais têm que se auto-questionar, de rever valores e de se informar o mais possível. Depois vem o diálogo, onde se quebra a grande barreira. Para o homossexual é um momento muito importante, pois passa a contar com os pais. A seguir é o acompanhamento, em que os pais devem demonstrar interesse pela vida social, escolar e afetiva do filho. Devem estimulá-lo a ter uma profissão, a ser independente e, sobretudo, devem estar disponíveis para acolhê-lo.
Muitos dos seus clientes querem casar-se e adotar crianças. Você é a favor?
Apoio totalmente. Se o indivíduo se harmonizar com a sua homossexualidade, poderá formar uma família e adotar um filho ou fazer uma inseminação artificial. Cerca de 1% dos gays e 15% das lésbicas na Europa adotaram filhos.
Porque há cada vez mais políticos a assumir a sua homossexualidade?
Nos anos 90, era impensável um político assumir publicamente a sua orientação homossexual. Seria isolado e não se reelegeria. Atualmente, muitos políticos, em particular, na Europa e Estados Unidos estão a sair do armário. Penso que é muito bom, faz com que as pessoas fiquem mais tolerantes com os homossexuais e os políticos serão avaliados, não pela sua orientação sexual, mas pela sua competência.
Houve muita evolução no conceito de homossexual?
Houve conquistas a partir de 1980 no Ocidente, maior visibilidade para a homossexualidade, avanço na legislação e maior aceitação.
A homossexualidade sempre existiu da mesma forma que a conhecemos hoje?
O primeiro registro histórico da homossexualidade foi encontrado em 1853 por arqueólogos britânicos, em Nínive, no Norte do Iraque. Os escritos, de 2.000 anos a.C. mencionam a afeição entre pessoas do mesmo sexo. A manifestação da homossexualidade tem sofrido variações ao longo da História. A novidade é que se tornou mais visível nos últimos 50 anos e a sociedade começou a reconhecê-la como algo natural. Deixou de ser considerada pecado, crime ou doença por várias culturas, apesar de as grandes religiões continuarem a punir sua manifestação.
Qual é a melhor forma para o homossexual lidar com o preconceito?
Deve combatê-lo e fazer uso das leis que o protegem. Desenvolver o auto-conhecimento, amparar-se em grupos, frequentar lugares homo são boas estratégias de defesa, usadas no processo terapêutico.
Como é que se explica que também haja discriminação entre eles?
A homossexualidade continua a ser condenada socialmente. Quando os mais afeminados revelam claramente a sua homossexualidade, os gays que ainda estão dentro do armário, ou são mais discretos, ficam incomodados e tentam isolar os outros socialmente.
Em que países é que há mais perseguição?
Segundo registro da Anistia Internacional em 28 de Junho de 2004, há 70 países que perseguem homossexuais e transexuais com base na legislação. A maior perseguição ocorre nos países muçulmanos. As punições são: multa, castigos corporais, prisão perpétua e trabalhos forçados e há países que aplicam a pena de morte. Mas continua a haver muita discriminação. Por exemplo, o Brasil é campeão mundial em mortes de homossexuais. Em 2005 foram assassinados 85, no México 35, e nos EUA 25.
A homossexualidade é genética?
Há pesquisas que indicam que as estruturas cerebrais são diferentes nos heterossexuais, outras apontam a possibilidade de existir um gene, o Xq 28, responsável pela orientação sexual homossexual, transmitido pela mãe. Já foi registrada a homossexualidade em espécies animais: elefantes, insetos, aves ou golfinhos. Coloca-se ainda a hipótese de a homossexualidade ter a função de regular o controle populacional nas espécies. Por isso existe há milhares de anos. Caso não tivesse uma função, teria desaparecido naturalmente. Mas nada foi comprovado e há poucos estudos sobre o assunto.
Porque é que muitas vezes os homossexuais têm uma mulher como melhor amiga ?
As mulheres são menos punitivas em relação à homossexualidade e, como não há interesse sexual, sentem-se mais seguras para contar os seus segredos aos amigos que são gays. Como eles têm a visão masculina, é interessante para elas consolidarem uma amizade com um gay.
Mas muitas vezes as melhores amigas são sempre mulheres bonitas?
Por que as mulheres bonitas são vaidosas e gostam de se cuidar como eles. O cuidado com o corpo, a roupa, a aparência física é muito valorizado na cultura gay. Daí muitas mulheres bonitas gostarem de ter como melhor amigo um gay, pois este valoriza a sua beleza, reforçando a sua autoestima.
Ou seja, os interesses comuns como moda, estética e beleza também reforçam esta amizade?
Sim. Mas não podemos generalizar. Há gays que têm com as mulheres interesses comuns e há outros muito masculinizados que gostam de moda, estética e beleza, mas numa perspectiva do que se chama na cultura gay, macho man. Assim como há gays que se interessam por automobilismo ou desporto.
Um gay pode apaixonar-se por uma mulher?
Apenas dentro de um contexto de admiração não no sentido sexual, pois um homem gay tem a sua orientação sexual direcionada para uma pessoa do mesmo sexo. Logo seu afeto e as reações biológicas e fisiológicas do seu corpo são direcionados para outro homem.
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